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sábado, 31 de março de 2012

A Ciência Mítica

Estamos em uma nova era, a, como é dita por tantos, pós-modernidade. Em vários âmbitos, como política e economia, há mudanças drásticas, discussões que não se viam há tempos, ou que nunca aconteceram, o que nos leva a perceber que vivemos tempos de mudanças. Um traço da dita pós-modernidade é o avanço científico. O avanço, na saúde, na tecnologia, na biologia, na física, na engenharia e em diversas áreas, é real. O homem deste século anda com passos longos. O futuro agora se dá em um espaço menor de tempo. Não pensamos em grandes mudanças para daqui a 100 anos, mas para daqui a um mês, uma semana.

02142012_ScienceFair-5_600Com essas constantes mudanças e “evoluções”, há quem diga – e muitos o dizem – que há questões que não precisam mais ser discutidas, que a ciência já nos deu as respostas necessárias e que só devemos partir destas respostas já obtidas, para encontrar mais e mais e progredirmos. Discutir a existência de Deus, a existência de um primeiro ser causador das coisas, discutir sobre a realidade ou sobre o que é conhecimento hoje tem se tornado atividade inútil. Afinal, para que discutir sobre coisas já tão ultrapassadas?

platao-aristotelesCada vez mais pessoas se baseiam no “cientificamente comprovado” para acabar com discussões e atestar sua certeza. Argumentos que comecem com “foi comprovado pela pesquisa do instituto X” ou “é cientificamente comprovado que” são mais normais e representam uma infalibilidade que não aceita contra-argumentos. A ciência não erra, os cientistas são imparciais, apenas falam as coisas quando podem provar, eles estão certos, não seria bem assim? Só devemos discutir o que a ciência ainda não pode, não é verdade?

Digo apenas que este “progresso” da sociedade com razão, comprovada cientificamente e inteligente, não é nada mais que a adoção de novos dogmas e de novos mitos, somada ao desejo de segurança, de certeza das coisas, que é muito comum ver neste século. Um comercial de um alvejante, detergente ou sabão em pó só vende quando se coloca alguém disfarçado de cientista dizendo que sua eficiência é comprovada cientificamente. Lemos uma matéria sobre buracos negros, viagens interplanetárias, física quântica ou o que quer que seja e, se a fonte for confiável – MIT principalmente – nós não contestamos, pois especialistas disseram.

Sempre é bom recorrermos aos antigos para entendermos como lidar com os novos. Se pensarmos que a filosofia começa com Tales dizendo que “tudo é água”, que Platão teorizava sobre um mundo exterior ao homem, formado de ideias, que Descartes não atribuía valor algum aos sentidos e que a ciência perdurou por séculos tentando constatar a veracidade do éter, percebemos que só avançamos quando colocamos à prova o que é “comprovado”, quando lemos, compreendemos e criticamos, quando não aceitamos tudo de antemão.

 

Não é porque se progrediu que tudo está correto. Não é porque a ciência avança que não ela não pode ser duvidada. Não é porque é ciência que é correto. Não podemos atribuir esta característica mítica à ciência. A ciência é feita por homens, falhos por serem homens. Devemos questionar não só a ciência, mas devemos também pensar em questões que ela não aborda. Como George Steiner sublinha em “Linguagem e Silêncio”, a ciência não consegue explicar o amor melhor que uma obra de Drummond ou Clarice.

4 comentários:

  1. Curti, curti muito, principalmente a musica...

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  2. Entendo o posicionamento feito, mas a forma como ele está sendo colocado é perigosíssima, dá a entender que a ciência é necessariamente errônea e deve ser desconsiderada, quando na verdade deve ser questionada e verificada!
    De qualquer forma, suas colocações são muito bem feitas e fazem a gente parar pra pensar :P

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    1. Se pareceram isso, desculpe-me.
      Não penso que a ciência é necessariamente errônea, pois "necessário" é um termo usado para a teoria da causalidade, de que algo não é sem sua necessidade vir antes. Em as teorias científicas serem errôneas ou não, isso pode ser relativo à época em questão. Só quis dizer que há uma espécie de mito criado a partir da ciência. Atribuímos à ciência o mesmo valor que gregos atribuíam à teogonia para explicar o mundo e parar de discutir a questão.

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